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VI- O dia de uma rainha

Os dias se passavam, mas ela ainda não se sentia em casa. Helena  se sentia sozinha enquanto caminhava para seus aposentos.Ela olhou para o seu jardim interno, sentiu o cheiro das ervas, e se sentou na beira das águas

Tudo ao redor era bonito, As ervas plantados no meio da tanque balançando com o vento, as paredes que levavam ao quarto de Hermíone e que agora estavam com trepadeiras floridas, o céu azul surgindo em meio à construção do palácio.

 Mas, as pálpebras do olhos de Helena estavam baixas. Ela estava triste e ainda assim, possuía aquela beleza que faria dela um  modelo valioso para qualquer escultor. Helena sentava no chão, no penúltimo degrau que levava ao tanque, e inclinava-se para com sua mão direita tocando a água. Atrás dela havia uma  coluna, mas ela não se apoiava sobre ela. Sua perna esquerda estava dobrada sobre o último degrau, seu pé direito já estava coberto pelas águas do tanque. Sua mão esquerda movia-se pelo cabelo, num sinal de preocupação, enquanto ela olhava para o céu.

“Menelau, de que adianta todos o presentes que você me dá, se você não é meu amigo. Será que estou pedindo algo errado quando desejo conhecer seus segredos. Você me apoia diante dos nossos filhos, você me defende, e ainda assim, você está tão distante de mim. Você não confia em mim, sua esposa. Não divide seus segredos comigo. Por quê?” Lágrimas desciam pela pele macia do rosto de Helena.

“E você Nicostratos? Você me diz palavras duras... como se tudo que eu fizesse fosse contra você. Mas, eu te amo. Eu quero o seu bem. Você é meu filho.E os deuses me deram um dom de percepção que estou usando para ajuda-lo.”

Helena tirou a sandália e colocou os dois pés na água, molhando o vestido até próximo ao joelho.Ela enxugou a lágrima.

"Mas, uma coisa eu admiro em você. Você é um garoto impetuoso, mas é sincero. Sim, eu admiro sua sinceridade, meu filho.”

“Mas, você Hermíone, como eu me esperava mais de você.” Agora os pensamentos de Helena saíam pela boca. Helena olhou para a janela do quarto de Hermíone e continuou pensando em voz alta:

– Você é mulher como eu sou. Podia me entender se quisesse. Você é quase uma mulher, e tem o coração de mulher. Porque não me aceita do jeito que eu sou? Porque não aceita o meu passado?”

 “ Eu não posso esquecer o meu passado. Eu não posso esquecer de mim mesma. O meu passado foi vivo, foi intenso. Ele me trouxe alegria, e felicidade. Seu eu desprezar o meu passado estarei morta e sem vida.""Páris está morto para que hoje eu tivesse uma nova vida. Como eu posso esquecer disso?

Se eu pudesse esquecer, Páris talvez me perdoaria. Mas, os deuses, como me perdoariam? Foram, eles que me levaram a Tróia. Eles tinham algo a me mostrar... E, Hermíone, ainda que eu quisesse não posso mudar o passado. Posso apenas aprender com ele. Porque você se recusa a aprender com o passado. Seu pai mesmo concorda comigo: devemos aprender com os nosso inimigos. Mas, você é surda a tudo que eu digo. Você se cala e não me responde, e seu olhar é de desprezo.” Helena, se colocou de pé e seguiu em direção as escadas que levavam ao quarto do andar superior. A escada, construída ao ar livre, recebia as gotas que caíam do vestido de Helena .

Chegando à sacada do quarto, ela deitou num kline ( uma espécie de combinação entre cama e sofá, reservado para o uso masculino).Ela suspirava fundo. Gostaria de estar em Tróia.

Helena penetrou no mais interior do quarto. Viu as belas cortinas que desciam do teto, como que dançando por entre as colunas. Viu sua cama talhada no cedro, viu duas pequenas mesas com alguns de seus pertences , e caminhou ate elas, tomando o espelho que estava sobre uma delas.

Ela olhava fixamente para o espelho enquanto um sorriso começava a surgir no seu rosto. Impossível não se lembrar de Páris. Ela olhava o espelho e se lembrava... “Seus olhos são como as fontes azuis de um jardim.” Helena, lembrava de Páris sussurrando esta frase em um de seus ouvidos. Então, nas suas lembranças, Paris sussurrava no outro ouvido e dizia: "Seu nariz é uma obra de um artista, melhor de um grande arquiteto. Ele é perfeito, tão perfeito como a torre de um palácio. Sua   boca é uma ameixa suculenta, que eu quero morder." Páris costumava dizer isto, enquanto simplesmente, beijava o seu rosto, no cantinho da boca.

Enquanto olhava para o espelho Helena se viu mais uma vez, como naquele dia em que chegou a Troia. Estava insegura e perdida naquela terra que não era a que ela havia nascido e crescido. Foi quando olhou seu rosto inseguro no espelho, e Páris começou a dizer tudo aquilo, até que disse: “Seu rosto é majestoso e forte como o de uma leoa.”

Não importa quão excitante fosse toda poesia, a parte que Helena mais gostava era esta: “Seu rosto é forte e majestoso como o de uma leoa.”

Páris foi o primeiro que viu nela majestade e coragem. Todos os outros homens a tratavam como a garotinha frágil e mimada. “Até minha mãe, me via assim. Para ela eu era a menina linda, mas boba. Incapaz de me relacionar com os outros.” Helena se lembrava de como sua mãe elogiava Climnestra, sua irmã. Se Helena conseguia fazer algo de destaque, então sua mãe dizia. “Você conseguiu fazer isto, imagine então se sua irmã tivesse tentado.”

Minha mãe sabia que todos me achavam a mais bonita, sabia que eu era a filha de Zeus, por isto tentava ressaltar Climnestra. Eu era bela, mas frágil e boba, ela era forte e inteligente. Como sou grata aos deuses que Páris não me viu assim. Páris viu a força que eu tenho, uma força suficiente para desafiar toda a Grécia, ir para guerra, perder a batalha, e ainda surgir coroada de cabeça erguida.

Helena procurava apagar as imagens que vinham com a lembrança da mãe. Ela procurava se imaginar como uma leoa rugindo sobre um alto rochedo a beira do mar. E, era isto que Helena acreditava que os deuses desejavam que ela visse nela mesma. Sim, seu pai ,Zeus, certamente esperava isto dela. Era ela uma leoa filha de Zeus. Seu pai rugia com os trovões os céus, ela rugia com os terrores da guerra. Seu pai, dos céus, via todos os homens, e a sua filha concedera uma percepção olímpica, para conhecer o caráter dos mortais.

– Louvado sejam os deuses do Olimpo, eu não merecia um privilégio tão grande como este. – Então uma voz a interrompeu...

– Minha senhora, é hora do seu banho. A menina troiana se aproximava dela com uma voz de tão insegura que faziam Helena se sentir mal.

– Quem você pensa que eu sou, Andere, Para falar deste modo? Acha que eu sou um bicho que vai te morder?

– Não minha senhora, você é doce e gentil. E muito linda. É que nunca fui escrava antes, por isto falo assim. –  Andere se aproximou com uma bacia e colocou no chão. Então, se aproximou de Helena e começou a ajudar a se despir. Helena olhava a bacia. Sabia que quando Andere terminasse de despi-la a água da bacia já estaria fria. Mas, era melhor assim. Melhor ser servida por uma única escrava em que confiava do que por várias que são falsas.

– A princesa Andrômeda disse que traria um vidro de perfume para você, mas ela esta demorando. – Andere dizia com sua voz insegura.

– Andrômeda? Porque você a chama de princesa? Ela é uma escrava. Mas, Vá chama-la, quero mesmo falar com ela.

Helena se lembrava de Andrômeda em Troia. Como as coisas haviam mudado. Em Troia Andrômeda olhava para ela com aquele olhar de superioridade que pareciam dizer: Ela era a esposa honrada, a mãe dedicada, enquanto Helena, a mulher infiel, a mãe desnaturada, aquela que trouxe a guerra. Como as coisas mudaram! Helena ria quando Andere voltou com Andrômeda.

– Minha Senhora, Minha Rainha, – Andrômeda fez uma pose de respeito e se curvou levemente – Trouxe de presente um novo perfume. Feito com flores desconhecida que descobri na vossa terra abençoada.

Helena não conseguia acreditar no que seus olhos viam. Andrômeda esta ali era apenas uma escrava, curvada, lhe oferecendo um presente. E havia algo mais estranho, ela parecia em alguma medida satisfeita e segura. O que afinal estava acontecendo com Andrômeda? Helena olhava para Andrômeda sem saber o que dizer. Seu rosto era o mesmo, os olhos, a boca, o queixo, as maçãs do rosto. Até o cabelo continuava comprido, brilhante, escuro, apesar de agora esta trançado de forma um pouco desconjuntada, e não balançar livre com o vento. Apesar das diferenças e das roupas mais simples, Andrômeda ainda parecia ter a majestade de uma princesa. “Na verdade, tinha, em alguma medida, uma majestade maior do que em Troia.”Helena virou as costas para Andrômeda e caminhou para a janela

– Minha senhora, algum problema? Queria te pedir perdão se causei algum mal a você em Troia. Hoje posso entender como é difícil estar longe da sua casa e da sua terra. Em Troia não fui capaz de entendê-la melhor.

Helena, que olhava pela janela respondeu:

– Pode ir agora. –  Helena ouviu os passos de Andrômeda se afastando. Então, pensou em voz bem alta.

– O que afinal, pelos deuses do Olimpo, e do Hades, está acontecendo com esta doida. Eu causei a morte do seu marido e do seu filho, como ela pode me entender, e me trazer presentes?

Helena caminhava de uma lado para o outro. Ela perdia a noção do tempo, enquanto se revirava em seus pensamentos. Andere a viu concentrada, e não teve coragem de lhe e propor novamente o banho. Helena se esqueceu do banho, precisava descobrir o que estava acontecendo com Andrômeda. Então, depois de muito pensar chegou a seguinte conclusão.

– Astianax, filho de Andrômeda, deve estar vivo. Dizem que Neoptoleno o matou. Mas, deve ter matado outra criança. Ele está em algum lugar escondido, sendo protegido por algum nobre troiano. Talvez com Eneias, que escapou. Andrômeda sabe de tudo isto, por isto esta bem. Ela esta feliz pela expectativa da vingança que virá. Mas, quer disfarçar tudo, por isto tenta ser agradável e me traz presentes.

Helena disse tudo isto, ate que percebeu que Andere estava ali, ouvindo tudo.

– Corto sua língua se contar isto a alguém.

– Não vou dizer nada, minha senhora.

– Então, vá chamar meu marido.

– Minha senhora, a senhora ainda não tomou o banho. Ainda não está pronta.

– Não importa, vá chama-lo.

Helena se sentou numa cadeira. “Não estou pronta. Não estou pronta para passar a noite com Menelau. Havia me esquecido disso. Terei que passar a noite com ele. Maldito rei de Esparta!” “Bem não é tão difícil assim. Eu gostava de estar com ele quando era jovem”...

Helena procurava relembrar. Menelau se destacou de todos os jovens que vieram corteja-la em Esparta. Ele foi marcante desde o momento que se apresentou e disse seu nome. Sua voz a seduzia. Ele era alto forte, de cabelos loiros. As primeiras noites com ele também foram intensas. Eles se entregaram uma ao outro antes mesmo do casamento. Mas, então tudo mudou...

Helena interrompeu seus pensamentos e olhou o frasco com o perfume que Andrômeda trouxera. Ela foi até ele e abriu a tampa. O cheiro era agradável. Talvez o perfume a ajudasse a parecer mais encantadora a Menelau, já que não havia se banhado... O aroma realmente parecia trazer um pouco da idéia de prazer. Então, ela se lembrou de Andrômeda.

"Talvez ela pôs no frasco alguma poção, algum veneno”. Helena tomou o frasco e o lançou na parede quebrando o frasco. Um aroma agradável começou a penetrar o ar, trazendo para Helena um convite a lembrar do prazer que teve com Menelau no passado. Mas, Helena respondeu ao aroma:

– Impossível recuperar todo o prazer que tive com você, Menelau. Eu não sou mais a mesma. Eu não quero ser mais a mulher que você conheceu. Sou uma leoa, não uma flor perfumada.

 

 

 

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