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V- Encontros e desencontros

 

 

Hermíone olhava pela janela do seu quarto. Logo abaixo havia o jardim que seu pai havia construído para sua mãe. O jardim  era formado por 3 grandes tanques com água . O tanque do meio do jardim, possuía no seu centro, quatro canteiros com plantas.  Hermíone não se lembrava do nome daquelas ervas, mas pelo cheiro podia sentir que eram aromáticas. Ao lado do tanque havia alguns vasos , colunas e estátuas. Hermíone, em geral, gostava de jardins. Mas, havia algo estranho na atmosfera daquele jardim que lhe incomodava.

Hermíone viu que perto das colunas havia uma trepadeira plantada. O jardim ficaria ainda mais bonito quando aquelas trepadeiras crescessem. Ao fundo do jardim havia uma escadaria, e no final, o santuário para Afrodite, com dois altares à frente. Hermíone também podia ver as portas dos aposentos de sua mãe que davam para o jardim. Belos portais estavam ali, do lado esquerdo do jardim. Não havia nenhuma entrada para o jardim do lado direito, onde estava seu quarto .Estava bem claro que o jardim era apenas para sua mãe.  E este fato deixava  a garota revoltada. Afinal que adiantava ver um jardim da janela do seu quarto e não poder ir até ele?

Hermíone se afastou da janela e sentou na sua cama. Bem, afinal ela não gostava daquele jardim, havia algo estranho em sua atmosfera que afastava dele. Neste momento Nicostratos , seu irmão, entrou no quarto e interrompeu seus pensamentos.

– Você acredita que hoje a mamãe vai chegar ? Você pode imaginar Hermíone, temos uma mãe que vai viver conosco.

Hermíone ouvia Nicostratos, mas não respondia. ‘Mãe?’ Ela se perguntava. Porque não conseguia ter o mesmo entusiasmo que Nicostratos? Talvez fosse por causa de sua mãe que ela se incomodava tanto com aquele jardim. Aquele jardim já tinha um pouco da atmosfera de sua mãe.

Nicostratos continuou:

– Hermíone, vamos até o terraço frontal do palácio esperar a mamãe. Ela deve estar chegando.

– Você pode ir Nicostratos. Eu vou esperar aqui. Venha me chamar quando ela chegar. – Disse Hermíone sentada no seu leito.

Nicostratos acabou por perceber que Hermíone não estava nenhum pouco entusiasmada com a chegada de Helena e saiu. Ela voltou para a janela do quarto que dava para o jardim. “Será que um dia ela já fora tão ligada a sua mãe como Nicostratos era? Sim, houve um tempo, mas foi muito, muito tempo atrás”.

Hermíone tinha uma vaga lembrança disso. Aquele foi um tempo especial,  era um tempo em que sua mãe a entendia muito bem. Ela tinha medo dos pequenos gecos, e chorava muito se via algum no palácio. Sua mãe a entendia e a acalmava. Acho que algumas vezes ela ia dormir junto com mãe, no seu quarto.

Afinal, foram os pequenos gecos que serviram para ensinar a Hermíone que sua mãe não era mais a mesma, ela se tornava distante e não podia mais entender seus anseios infantis. Teve aquele noite em apareceu um geco no seu quarto, mas sua mãe não veio.  Hermíone mandou uma escrava chamá-la e  mesmo assim ela não veio. Então, foi até sua mãe, e ela respondeu: “Hermíone não tem nenhum geco, você está enganada, volte para o quarto". Mais, tarde , naquela mesma noite Hermíone  voltou a correr ate o quarto da mãe, mas ele estava trancado. Hermíone olhou pela fechadura procurando por sua mãe, e viu algo que não podia entender. Sua mãe estava com um homem, e não era seu pai. Neste momento Nicostratos interrompeu os pensamentos de Hermíone, ele dizia que sua mãe estava vindo. Hermíone, não se movia. Não queria queira acreditar naquela notícia. Por isto o menino insistiu:

– É ela mesmo, Hermíone!

Hermíone se levantou e começou a acompanhar Nicostratos até o átrio da casa. Atravessava os corredores, descia a escada. Realmente Hermíone não estava feliz com o retorno de sua mãe. Já tinha agora, 16 anos, mas não esquecia o segredo que tinha descoberto quando era uma criança de seis anos. Ela sabia que havia algo entre Páris e sua mãe. E sabia que Helena não havia sido raptada. Foi uma traição de sua mãe. Helena fugiu, ela aceitou ir com o maldito troiano. Abandonou seu marido e seus filhos, sem ao menos se despedir. E, agora ela está de volta, sendo tratada como uma rainha. Num palácio novo que papai mandou construir para ela. Que ao menos sua beleza seja suficiente para satisfazer o papai!

– Vamos Hermíone, ela está chegando.

Hermione caminhava devagar. Nicostratos já estava bem a sua frente. Hermíone não conseguia aceitar o seu entusiasmo, mas correu para acompanhá-lo. Afinal chegara o dia do encontro, depois de 10 anos. Hermíone se aproximou do átrio da casa e viu sua mãe. Era bonita como todos os diziam. Alta com um belo rosto, lábios sedutores que lhe dirigiam um sorriso. Hermíone se aproximou de sua mãe e fingiu um abraço. Tentava dizer “mãe”, mas seu coração estava duro. Nicostratos pode abraçar a mãe de forma mais carinhosa. Não abraçava a mãe com a ingenuidade de uma criança. Sabia, por Hermíone, do seu abandono, da sua traição. Mas, ainda assim podia sentir um carinho e necessidade materna.

 Mas, Helena seria capaz de apagar o pequeno quadro de ternura que começava a se formar no seu oikós.

–Meus queridos filhos como senti saudade. Como é bom ver que estão bem e que estão crescidos... Venham, deixe-me mostrar que lhes trouxe presentes.

– Á Nicostratos trouxe um arco de prata. Aprenderás a usá-lo até ser capaz de acertar uma mosca como o príncipe Páris.

A menção a Páris perturbou a todos. Mas, ninguém disse nada. Era a recepção da mamãe. E Helena não desconfiou do desconforto que existia em suas palavras, ou pelo menos fingiu que não percebia

– Á Hermione também trouxe presentes– continuava Helena –Um lindo colar de ônix, marfim, e ouro. Tirei-o dos tesouros de Hécuba, enquanto a rainha troiana chorava.

– Obrigada... Mamãe – finalmente Hermíone conseguiu dizer a palavra “mãe”.– Vou guardá-lo cuidadosamente em meus aposentos.

Hermíone virou-se e dirigiu-se para seu quarto. Menelau percebendo hostilidade que estava presente em seus gestos lhe chamou.

– Espere Hermíone, também tenho presentes para você.

A voz de papai tocava o coração de Hermíone. Ainda se lembrava do carinho que recebera dele desde que era criança.

– A partir de hoje – Menelau anunciou com entusiasmo – Você será servida pela mais nobre das princesas troianas. Será dona de Andrômeda, esposa de Heitor.

 Neste momento um escravo apareceu no átrio introduzindo Andrômeda. A princesa, escrava, fez uma reverência na presença de sua jovem senhora. Enquanto Helena protestava:

– Esta maldita será escrava de Hermíone?

Ao ver o protesto de sua mãe, Hermíone vibrou.

– Pai, é o melhor presente que já ganhei. Nunca imaginei que Andrômeda seria minha escrava!

– Sim, minha filha. É uma grande responsabilidade ser senhora de Andrômeda. Demonstre força e sabedoria ao dominá-la. Agora, Nicostratos, venha aqui fora e lhe mostrarei o seu presente. A porta do palácio estava um belo cavalo negro, conduzido por um escravo.

– Este é Dínamos, um dos melhores cavalos troianos. E este é Lemnôn, o mais hábil treinador de animais. Com a força de Dínamos, e a sabedoria de Lemnôn venceremos os próximos jogos espartanos. – Nike, Papai! Nike! – Nicostratos falou com entusiasmo.

– Nike. – Concordou Menelau.

Ao retornarem para o átrio, Menelau e Nicostratos, encontraram Helena inconformada . Seu olhar para Andrômeda demonstrava que  ela não gostava da princesa escrava, e por isto se despedia :

– Meus filhos, meu amado rei, tive uma cansativa viagem e gostaria de me retirar para meus aposentos.

– Minha rainha, disse Menelau. Também tenho um surpreendente presente para você. Neste momento entrou num átrio um jovem escravo troiano, trazendo nas mãos um vestido bordado com linhas de ouro.

– Este é Deádalus, um hábil tecelão troiano. Você não ficará mais sem os lindos vestidos de Tróia, dos quais tanto sente falta. Helena se surpreendeu com o presente de Menelau. Não esperava por esta iniciativa. Mas, ainda não era capaz de agradecer com entusiasmo.

– Agradeço, ao meu marido, meu rei. E gostaria de me retirar para os meus aposentos. – e virando-se para seu novo escravo disse – Déadalos me conduza a meus aposentos.

Hermíone viu a mãe, e depois o irmão desaparecer pelo corredor, enquanto se conformava e dizia para si mesma : “Este foi o reencontro, o belo recomeço da família real”. Então, virando-se para o pai se arrependeu de ser tão fria.

 

(...)

 

Menelau caminhou para a entrada do palácio buscando com os olhos o vazio do mar. Aquele não era o melhor dos recomeços para sua família. Mas, isto não abalava seu  propósito . Todos haviam saído do átrio, mas Menelau voltou seu olhar para ele tentando entender o momento que se passara. Ele desejava uma família unida e continuaria fiel a este propósito, não importa o que acontecesse.  É verdade que Helena havia atrapalhado seu propósito naquele dia. Mas, isto não era o suficiente para desanimar Menelau. Ele não iria se afastar dela de novo. Ela havia se afastado dela antes da guerra, e acabou a perdendo. “Nunca mais vou me afastar dela”.

Menelau ignorava as atitudes de Helena porque reconhecia que de alguma forma, antes da guerra, havia falhado com ela. Embora, não admitisse a possibilidade de Helena ter escolhido o príncipe troiano por causa disto. Para Menelau Helena fora raptada pelo príncipe troiano. Mas, o maldito, agora, habitava o Hades.

 

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