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II- Olhar que corta as ondas  

Tértulo olhava as ondas do mar que estavam a sua a frente. Era noite. Mas, a lua brilhava cheia de modo que  podia ver claramente as ondas a frente do seu navio. O bico do navio  atravessava, e quase cortava as ondas. O navio não era muito grande. Possuía apenas um mastro no centro, um compartimento abaixo da proa, e acima da proa, uma pequena plataforma, sobre a qual Tértulo estava. O navio era pequeno se comparado aos atuais, e pequeno mesmo se comparado as trirremes que seriam usadas pelos gregos no futuro. Mas, para o contexto aquele era um eficiente navio. O escravo do rei Menelau cruzou os braços e se postou com firmeza diante do vento que batia no seu rosto. Então, ele reparou no ultimo inimigo que ainda precisava vencer.

O jovem estava  logo abaixo, na proa, entre os remadores . Era um soldado musculoso, mas não tinha uma aparência tão boa se considerasse que era filho de Cassandro, um poderoso ancião de Esparta. Teleu tinha tudo que Tértulo não tinha, era nobre , rico e livre. Ainda assim,  Tértulo iria vence-lo na sua disputa por Effie. Tértulo sabia que assim, que ele terminasse o seu turno Teleu iria ao porão do navio procurar pela escrava troiana. Mas, a linda Effie não era para aquele garoto. Não era nem mesmo para o próprio Tértulo. Ele iria conservar a troiana virgem, para usa-la em um propósito maior. Ameaçando a mãe de Effie, ele conseguiria o que quisesse da bela jovem, e usando Effie conseguiria o que precisava do rei Menelau. Effie não era nobre. Mas, não seria difícil fazer o rei Menelau acreditar que Effie tinha sangue real. Virgens são instrumentos úteis, ainda mais se são amores ilícitos e tem sangue real.

Enquanto descia para a proa Tértulo ouvia o som do mar e dos remos. Os remos agora batiam nas águas do mar em sincronia. Seus novos escravos estavam aprendendo a remar como deviam. Tértulo havia separado alguns troianos para ocuparem a função de remadores . E, enquanto atravessava o corredor que havia em meio dos remadores, sua mente se esforçava por recordar tudo que já sabia sobre seus escravos. Tértulo se esforçava para decorar o nome de todos, e conhece-los para ser capaz de dominá-los. Havia alguns escravos troianos que foram postos na parte frontal. “Os seus nomes: Lemnon, Thalos, Daimon, Aristeu, Alcestes”  relembrava. Xenofonte que remava no meio deles era o soldado grego responsável para vigiar estes escravos.  Mais ao fundo do navio estava outros quatro escravos gregos, três destes escravos eram mais jovens Pearce, Hecate, Deádalus, e um mais velho, o eunuco Anakes. Cadmus era o escravo grego responsável por estes escravos e Onésimo era  o soldado que o auxiliava.  Teleu, o jovem mimado, estava no grupo de Cadmos. Ao total , eram 12 soldados que espalhavam em meio aos escravos. Seis deles auxiliavam na função de remadores. Ainda assim, os homens eram poucos para a função de remadores, e dos 48 remos, apenas a  metade estava sendo utilizada.

Na proa , no meio dos remadores, também estava assentada alguma mulheres troianas , mas a maior parte das mulheres e meninas troianas estava no compartimento abaixo da proa. Ali havia espaço para mais 12 remadores. Mas, nenhuma das mulheres ocupava estava função. Também não havia nenhum soldado vigiando estas mulheres,  Tértulo não queria suas virgens violadas. O escravo de Menelau tomou um dos candeeiro que estava pendurado sobre o mastro e desceu para a parte inferior do navio. Tértulo continuava ouvindo o ritmo dos remadores, que agora, era interrompido apenas pelas tosses de um escrava ...

Assim, que desceu as escadas ele dirigiu as chamas da lâmpada em direção à escrava que tossia. Ele viu uma escrava com uma menina , que deitada com o rosto no seu colo dormia tranquila. A mulher , magra e com uma expressão insegura no rosto, continuava a tossir sem parar. Esta tosse iria atrapalhar o seu sono o naquela noite. Ele devia lançar a escrava no mar?  Tértulo olhava para menina dormindo no colo da mãe e hesitava fazer isto. Ele se lembrava da sua própria mãe. Então, dizia para si mesmo: “ Não escute seus sentimentos  instáveis , pense nos seus objetivos . Existe alguma vantagem em deixar esta menina viva com a mãe?” Tértulo se dirigiu a escrava e disse:

– Pare de tossir. – A sua voz não soava forte, mas ele falava com segurança.

Seria uma fraqueza levantar a voz para falar com seus escravos. Eles precisavam aprender a obedece-lo mesmo quando falasse em voz baixa. Homens sem poder gritam porque precisam da altura da voz para reafirmar o que dizem, já que não tem autoridade. Ele tinha autoridade. Se a escrava não parasse de tossir ele a lançaria no mar. Esta seria uma boa oportunidade para ensinar seus escravos a respeita-lo.

– Tértulo –  Tértulo ouviu uma voz feminina

– Andrômeda?

–  A escrava que está tossindo está com febre, talvez um pouco de agua pudesse ajuda-la.

Tértulo não admitia que nenhum escravo falasse com ele com tanta confiança, mas se sentia um tanto quando imobilizado olhando para aquele rosto. Então, se limitou a ignorar a princesa. Tertulo ficou satisfeito porque a ex-princesa logo entendeu o que significava sua indiferença, pois  voltou a se sentar sem dizer mais nada.  Ainda assim , Tértulo considerava que aquela confiança de Andromeda era exatamente do que ele precisava naquele momento.

Caminhando em meio ao balanço do navio Tertulo foi até os cestos que consistiam na pequena dispensa daquele navio. Não havia muita coisa ali além de comida , mas Tértulo precisava encontrar um corda . Tértulo deu o candeeiro para que uma das escravas o segura-se e, enquanto remexia entre os sacos e cestos , Tértulo relembrava de seu encontro com a princesa Andrômeda.

Ele estava para embarcar quando ela apareceu. A mulher vestida de trajes nobres lhe disse: “Sou Andrômeda, esposa do príncipe Heitor. Fujo de Neoptoleno, filho de Aquiles, e peço que me receba no seu navio, pois desejo servir a rainha Helena.” Tértulo ainda se perguntava  porque, afinal, havia concordado em ajudar aquela escrava. Talvez fosse por aquele ar olímpico que ela possuía. Ela não falava com o temor, tinha segurança. Mas, não era só isto. Ele se lembrou do que aconteceu quando o rei Agamenon roubou a escrava Brizeis, de Aquiles. Agamenon, rei dos reis, teve que ceder a Aquiles, o guerreiro. E, Neoptoleno, filho de Aquiles era um guerreiro a altura do pai. E, ainda assim, ele Tértulo, filho de uma escrava desconhecida, havia lhe roubado Andrômeda, sem que Neoptoleno, nem ao menos tivesse ideia. Ele se sentia vitoriosos por estar com Andrômeda. E novamente ria para si mesmo: “ Tértulo, filho de Calidora, você desafiou Neoptoleno, filho dos imortais.” Depois de um tempo procurando, Tertulo encontrou a corda e a transformou num laço.

Tértulo, então, voltou à luz  da lâmpada mais uma vez para Andrômeda. Ela estava ali sentada como todas as outras escravas. Mas, algo muito diferente havia nela.  As roupas realmente não eram como das outras escravas, mas no escuro do navio não fazia tanta diferença. Os cabelos  eram compridos escuros, iam até os joelhos . Parte do cabelo estava trançado, formando um penteado que deveria ter sido muito belo, mas que agora estava levemente desfeito. Mas, não era o cabelo que fazia com que ela se destacasse. Era seu rosto, um rosto bonito ele admitia, mas que tinha  mais majestade do que beleza. E, a majestade da princesa vinha daquele olhar.

–  Andrômeda, tenho uma tarefa importante para você .

– Sim, meu senhor. – Andrômeda respondia com aquela mesma voz que transparecia, ao mesmo tempo, humildade e autoconfiança.

– Tire seus vestidos e troque com Effie.

– Sem problemas, meu senhor.

– Mas, não é apenas isto. Venha cá.

A escrava princesa não se levantou. Mas, a feição do seu rosto se abatia de modo que Tertulo podia perceber o pavor que Andromeda tinha do estupro. Percebendo que a não ia se levantar , ele puxou com força em direção na sua direção, e apertando o seu pescoço , ele lhe falou aos ouvidos:

– Tome esta corda e coloque no pescoço de qualquer homem que tentar violentar uma mulher. Principalmente se for Effie. Mas, esta arma é apenas para defesa, não para assassinato. Se, não cumprir este acordo eu te enviou de volta para Neoptoleno. Ou, eu mesmo faço o que ele não conseguiu fazer.

Satisfeito em ver a resposta que havia nos olhos de Andrômeda,  Tertulo se aproximou da escada que levava para a proa. Ali perto da escada ele viu uma escrava que o interessou. A escrava não tinha os traços finos como os de Effie. Mas, tinha os lábios grossos os seios fartos. Ele já a havia visto antes. Mas ela estava em prantos, chorando a morte dos  filhos . E por isto não pode ver a sua beleza em meio aquele escândalo. Agora estava dormindo . Parecia cansada. Qual era mesmo o nome dela? Tértulo não se lembrava.

Tértulo a olhou atentamente, e subiu. Mais uma vez procurou por seus escravos, que estavam misturados com os soldados. Viu Anakes, o eunuco, Aristeu, seu filho, os meninos, Lemnon, o treinador de cavalo, sua esposa, e seus 3 filhos, os escravo mais jovens, o ex- soldado troiano. As meninas, Lena e Nephele que dormiam, e outra a menina que tinha uma queimadura grande no rosto. Seu nome era Stesha? Tértulo não tinha certeza. Depois das meninas, Cindia e, Ailim , a velha da nobreza, em mais duas mulheres que ele não sabia o nome. Uma delas era a escrava que o rei Ulisses dera a Menelau, já que não possuía mais espaço no seu navio. Ela estava com duas crianças deitadas no colo. “Porque o rei Ulisses deixou aquela mulher viva? Não parece haver nada de especial nela, nem mesmo na menina. Talvez o menino é mais esperto. Aquele olhar de curiosidade sugeria algum potencial nele. Mas, a mulher e a menina pareciam inúteis.”

Um soldado mais velho se aproximou dele.

– Agora é hora de trocar o turno dos remadores.

Ele se virou para os homens e gritou:

– Mudança de turnos.

Os homens que descansavam começaram a remar. E Teleu, o jovem espartana se levantou. Tértulo se dirigia ao final da proa, enquanto no seu intimo ria do garoto musculoso. Tinha quase certeza de que Andrômeda seria capaz de surpreende-lo com a corda. E, tinha ainda mais certeza de que o jovem nunca contaria para ninguém que foi surpreendido por uma mulher. Tértulo se sentou no final da proa, queria se envolver mais na situação , mas não podia . Ninguém podia saber o que ele estava fazendo contra o filho do poderoso Cassandro.

 Tertulo sentia-se humilhado por ter de dormir ali no meio daqueles escravos inferiores. Mas, não havia outro aposento para ele. Naquele momento ele gostaria de ter um navio como o de Menelau. Tértulo tentou se sentar na posição mais autoritária que conseguisse. Mas, não era confortável. Então, mudou de posição . Agora sentia seu corpo relaxando, o sono vindo.

Ele pensava no seu passado e em tudo que tinha alcançado. Lembrava de sua mãe , uma escrava grega do oikos de Menelau que foi violentada por um nobre desconhecido. Ele lembrava do dia que o rei  Menelau lhe disse: “Você ira comigo a esta guerra maldita”.  De escravo o a chefe dos escravos, este era o maior despojo que ele encontrara no final daquela guerra.  Menelau nunca podia imaginar o quanto ele era grato pela vida do “ maldito troiano” que roubou a esposa do rei.

A noite passou muito rápida para Tértulo. E quando ele despertou sentia o corpo dolorido. Pela manhã caminhava entre os seus escravos esperando espantar o desconforto do corpo e despertar do sono. Ele quase não conseguiu segurar o riso, quando viu  o pescoço vermelho do nobre Teleu. Enquanto se sentia satisfeito com sua estratégia, um dos meninos falou com ele.

–Tértulo, Gálem pegou o meu rato e deu para Sibila.

Ele se admirou com audácia do menino, ele era corajoso, por falar com ele daquela forma. Tinha que tomar cuidado com ele. Mas, ainda queria poupar a sua vida. Só precisava a ser perspicaz para que não escapasse do seu controle. Ele não deu atenção ao que o menino dizia e ele se aquietou diante do olhar repreensivo dos outros escravos troianos Tértulo havia poupado à vida de alguns meninos e jovens troianos, mas sabia que os gregos, e muito provavelmente  o rei Menelau, desejavam ver todos do sexo masculino mortos. Mas, o chefe dos escravos sabia que eles podiam ser úteis no futuro.

 Ele se dirigiu para frente do navio e se pôs a olhar o mar. Então, finalmente desceu para o compartimento inferior a fim de satisfazer sua curiosidade.  Tudo parecia tranquilo. Ele descobriu o nome da escrava que observara na noite anterior: era Alexia. E, realmente era muito bonita. Tértulo escolheu Alexia para seus desejos. A corda que ele havia dado a Andrômeda agora estava próximo aos cestos de comida. Andrômeda e Effie pareciam bem. 

Tértulo virou-se para subir novamente .  Quando reparou no olhar  seguro de Andrômeda.. Será que havia falhado ao confiar na ex-princesa troiana?  Será que ela escondia algo : Aquele olhar não era apenas uma olhar de princesa, é um olhar de quem tem um plano. Talvez Tróia não estava completamente destruída como todos pensavam. Eneias, um nobre troiano, havia fugido , e talvez Andrômeda fazia parte de algum plano de Eneias. Será que foi Eneias que  libertou Andrômeda de Neoptoleno? Mas, porque Andrômeda iria escolher Menelau e Helena como seus senhores? Como isto encaixava no plano de Eneias? Tértulo precisava descobrir, talvez existisse alguma grande vantagem em se tornar um aliado da princesa troiana. 

Quando tornou a subir percebeu que o rei Menelau havia chegado ao navio.

– Majestade, filho dos deuses, creio que ficará satisfeito ao conhecer seus escravos. A guerra levou a vida de muitos troianos, mas poupou os melhores para o seu serviço.

– Muito bem Tértulo, quero conhece-los. Menelau respondia com uma voz que denunciava algum descrédito em relação ao entusiasmo de Tértulo;

– Temos dois homens capazes que sabem ler e calcular; Aristeu e Anakes. Ele é Lemnon um grande treinador de cavalos. Tértulo apontava para os escravos que remavam.

Enquanto apresentava os escravos, Tértulo reparava como a feição deles estavam apreensivas diante de Menelau. 

– E o tecelão, Tértulo? Você conseguiu algum tecelão?

– Sim, consegui um com Ulisses, o rei de Itaca. É aquele logo atrás de Cadmus.

– Ótimo, diga o que mais nós temos?

–Temos mulheres de boa aparência e até mesmo mulheres da nobreza.

– Da nobreza?

– Sim, vou mandar chamá-las.

 Depois de alguns instantes Tértulo voltou com mais escravas.

– Esta é Ailim, prima do rei Nestor. Está é a linda Effie, sobrinha da rainha Hécuba– Tértulo apresentou Effie com um sorriso que escondia uma mensagem para Menelau. Mas, como ele não pareceu receptivo a ideia, Tértulo continuou e apresentou outra escrava

– E está é a princesa Andrômeda.

– Andrômeda? Esposa do príncipe Heitor? Não sabia que ela estava entre os nossos escravos. Achei que pertencia a Neoptoleno.

 – Não meu senhor, Andrômeda foi capturada por um de nossos soldados. – Tértulo falava sobre Andrômeda com um pouco de receio. Mas, aparentemente Menelau não desconfiou de  sua fuga.

– E as crianças de que me falou. Realmente acha que estas crianças vão nos ser úteis? Para mim crianças só atrapalham. Elas podem ajudar pouco na construção do palácio; Você deveria vender as crianças em Esparta.

– As crianças são escravos mais dóceis. Não tem o rancor da guerra dos demais escravos. Em pouco tempo se tornarão escravos leais e úteis. Eu me responsabilizo por elas. Para que não criem nenhum problema. Já separei uma escrava para tomar conta das crianças.

– Bem, se realmente não criarem problemas pode continuar com elas. Se não, livre-se delas.

Ele continuou apresentando os escravos a Menelau. Havia homens enfraquecidos pela  guerra, como Alcestes, um ancião, e Daimon, que não conseguia andar. Mas, ele pensou numa função para cada um, Daimon trabalharia no tear, e Alcestes, ajudaria olhar as crianças. Também separou algumas escravas que poderiam trabalhar no palácio, e outras, que devido à aparência foram separadas para trabalhar  nos campos. Ao final da conversa Menelau aprovou a forma como Tértulo estava organizando os escravos:

– Posso ver que você pensou em tudo, Tértulo.

Ele se sentiu vitorioso com o consentimento do rei Menelau. Era bom ser aprovado pelo seu senhor. Mas, não era apenas isto que ele estava comemorando no seu intimo. Ela havia conseguido a maior parte do que estava planejando. O rei não se interessou por Effie naquele momento, mas aquilo logo iria mudar, pois ele acreditou que ela era nobre. Também se sentia satisfeito por Menelau ter poupado a vida das crianças. Crianças são instrumentos moldáveis e ingênuos. Como as crianças ainda não entendiam bem a hierarquia da casa, facilmente seriam ensinados a respeitar mais a Tértulo do que a Menelau. Algumas delas também poderiam apreender a bisbilhotar o palácio e lhe manter informado de segredos importantes. De modo que, em alguns anos, ele teria mais poder naquele palácio do que o rei Menelau.

Enquanto Menelau descia em direção ao pequeno barco que estava próximo ao navio, Tértulo concretizava seu último plano, falando a meia voz.

 – Majestade, não deseja levar o jovem Teleu para o seu navio ? Sinto que ele não se adaptou muito bem ao nosso navio.

– Eu vi as marcas no seu pescoço . O que aconteceu?

– ...uma mulher.

– Sim, mande chama-lo. Devo isto ao nobre Cassandro.

Teleu descia para o barco do rei Menelau enquanto Tértulo reparava no olhar dos escravos. Anakes, Lemnon, Aristeu,  pareciam aliviados com a ausência do rei. Tértulo se incomodou com isto: “Porque seus escravos não o temiam da mesma forma?” respirou fundo .Estava claro que sentiam mais medo do rei Menelau do que dele mesmo. Na verdade, isto não era em nada surpreendente. Até agora mostrara apenas bondade para Aristeu e Lemnon ela havia poupado a vida de suas família. Na verdade,  havia poupado à vida de muita gente naquela guerra.

Tértulo voltou seu olhar para as ondas e para o navio que atravessava por elas. No final do casco do navio  havia o desenho de olhos. Um a direito outro a esquerda do navio. Aquele olhar, que cortava as ondas, trazia ainda mais imponência para o navio. Parecia que o navio olhava com confiança para Netuno, deus dos mares, parecia que ele passava pelas moradas dos monstros marinhos sem ter medo.

Tértulo também estava confiante com o futuro, mas ele precisava agir  Agora, ele precisava ser cruel. Sim, precisava. Se os homens pudessem ser leais a ele apenas por gratidão ele poderia continuar sendo bondoso. Mas, este não é o caso. Os homens logo se esquecem da gratidão. Mas, o medo se multiplica. O que faria para mostrar crueldade? Precisava encontrar um meio de dosar a bondade com a crueldade. Ambas deviam ser exercidas na medida adequada ao poder , e o poder pende mais para a crueldade do que para a bondade. A bondade simplesmente acrescenta ao poder um pouco de glória. Haveria alguém que alcançou o poder sem demonstrar crueldade?

Ele se perguntava: porque afinal, havia concordado em ajudar aquela escrava.Talvez fosse por aquele ar olímpico que ela possuía. Ela não falava com o temor que as mulheres da guerra falavam, ela tinha segurança. Mas, não era só isto. “Não , não é. Sou um mero escravo e estou desafiando o grande Neoptoleno.” Ele se lembrou no que aconteceu quando o rei Agamenom roubou a escrava Brizeis , de Aquiles. Agamenon, rei dos reis, teve que ceder a Aquiles, o guerreiro. E, Neoptoleno, filho de Aquiles era um guerreiro a altura do pai. Depois que Aquiles foi morto, os gregos foram busca-lo em sua terra, pois os oráculos disseram que a Guerra não seria conquistada sem a sua presença. E, ainda assim, ele Tértulo, filho de uma escrava desconhecida, havia lhe roubado Andrômeda, sem que Neoptolene, nem ao menos tivesse idéia. Ele se sentia vitoriosos por estar com Andrômeda. E novamente ria para si mesmo: “ Tértulo , filho de Calidora, você desafiou Neoptoleno, filho dos irmotais.” Neste momento uma voz interrompeu os pensamentos do escravo grego, era uma menina que chorava. E o choro vinha da proa do navio. Ele procuruava reconhecer a voz , mas não conseguia saber quem era. Era cedo para que ele conhecesse tão bem a voz de seus escravos. Uma segunda voz surgiu:

– Porque você esta chorando Nephele?

Agora Tértulo sabia de quem se tratava . Era Nephele irmã, de Narek. Narek, era um menino de 12, o único que não parecia muito amedrontado durante a viagem. Mas, sua tranquilidade tinha uma boa explicação. Narek não viu a guerra. Sua mãe conseguiu ficar escondida no campo com Narek e sua irmã por muito tempo. Um dia a comida começou a acabar e ela escondeu os filhos num antigo poço seco e partiu. Ela não voltou mais e foi ali que ele encontrou os meninos perto do final da guerra. Enquanto Narek estava tranquilo, pronto para aventuras no navio escuro, sua irmã mais nova se sentia insegura. Ela sentia muito a falta da mãe, e se não via Narek por perto chorava. Lena, uma menina um pouco mais velha, tentava acalmá-la. Tértulo , só ouvia, não ia descer a proa para intervir:

– Narek, me deixou sozinha, ele foi caçar um rato...

– Ele não tem medo dos soldados?

– Não ele disse que quer comer um rato hoje, por isto me deixou sozinha...

– Nephele eu fico perto de você até ele voltar.

– Meninas, parem de conversa, logo os soldados vão se incomodar com e este barulho.

Nara, uma jovem senhora, falou nervosa com as meninas, e falava com uma voz que chamava muito mais atenção do que o murmúrio de Nephele.

“ Mulher desequilibrada” concluiu Tértulo a respeito de Nara.O navio ficou em silêncio de novo. O som das ondas, o barulho dos remos, a respiração dos remadores novamente ficaram marcantes... Mas, Tértulo prestava atenção a outros pequenos sons de movimento que chegavam ao seu ouvido.Então, novamente a voz de uma criança apareceu...

– Narek, para de caçar o rato, ele já é meu! Era a voz de um menino mais novo que falava com Narek.

– Não, não é não. Eu é que mostrei onde o rato estava – Respondeu Narek.

– Eu que o segurei. Ele é meu. – Falou Tersistes, um garoto de 10 anos. – Olhe Trífone, eu é que capturei o rato – Tersistes falava com outra menina que estava no navio.

A garota se assustou e deu um grito fino. Trífone era a única menina do navio que se assustaria com um rato. As demais já estavam acostumadas com os ratos, ou se não estavam, haviam visto tanta coisa assustadora na guerra que não se assustariam com ratos. Uma voz masculina surgiu e a voz de Trífone parou. – Trífone pare com este barulho.

– Ailin, por favor, segure Trífone para mim, eu preciso continuar remando. 

Cadmus, o escravo grego que estava no meio dos troianos questionou:

– O que está acontecendo por aqui?

Ninguém respondeu nada. O silêncio voltou ao navio. Tértulo se lembrava que Ailin também era da nobreza troiana, embora já tinha uma certa idade. Ele voltou a ouvir o ritimo do ritmo dos remadores, que agora, era interrompido apenas pelas tosses de outra escrava que estava bem doente...

Tértulo desceu da plataforma onde estava. Olhou os seus escravos, que agora eram iluminados pela luz de um candeeiro Os escravos estavam misturados com os soldados, mas a diferença entre um e outro era clara. Ele procurava o rosto de todos. Anakes, o eunuco, Aristeu, seu filho, os meninos , Lemnon, o treinador de cavalo, sua esposa , e seus 3 filhos, os escravo mais jovens, o ex- soldado troiano. As meninas, Lena e Nephele que dormiam,e uma outra a menina que tinha uma queimadura grande no rosto, e que fingia dormir quando Tértulo olhava para ela.Seu nome era Tesha? Tértulo não tinha certeza.Depois das meninas, Nara, a mulher desequilibrada, Ailim , a velha da nobreza, em mais duas mulheres que ele não sabia o nome.Uma delas era a escrava que o rei Ulisses dera a Menelau, com dois meninos deitados no colo.

Eram dois meninos ou um casal? Era um casal, mas a menina de cabelo curto quase parecia um menino. A menina dormia no colo da mulher, enquanto o menino erguia a cabeça com um olhar curioso. Reparou no rosto da mulher. Tinha uma feição um tanto comum. Rosto fino, cabelos lisos . Não era bonita mas seria uma mulher suficiente para um homem do povo. O corpo combinava com as feições do rosto: ombros curtos, magra e não muito alta.Tinha o aspecto de ser uma mulher rápida e disposta, capaz de fazer de tudo pelas crianças. Apesar disto, os meninos não se pareciam com ela. A menina estava suja e mal nutrida, e o menino tinha o rosto bem desenhado , que distoava da mulher. Tértulo caminhou em direção aquela escrava e lhe perguntou:

– Escrava, qual o seu nome ?

– Lépida.

– E as crianças?

– Ela é Naala, ele é Tércio.

A voz de Lépida soava um tanto desanimada, a as feições do rosto, enquanto ela falava davam sinais de uma personalidade apática. Concluiu que talvez ela não fosse tão ágil como suas feições pareciam sugerir. Ele se virou em direção a escada . “Bem, meus escravos estão todos em ordem, e passo a passo vou conhecer cada um deles”. Então, tomou uma lâmpada menor e acendeu-a nas chamas do candeeiro. Enquanto descia as escadas ele repetia para si mesmo os novos nomes: Tércio, Naala, Lépida. Porque Ulissas deixou aquela mulher viva?Não parece haver nada de especial nela, nem mesmo na menina. Talvez o menino é mais esperto. Aquele olhar de curiosidade faziam ele supor que havia algum potencial nele. Mas, a mulher e a menina lhe pareciam inúteis.

Assim, que desceu seus pensamentos foram interrompidos pela tosse de uma escrava. Ele dirigiu as chamas da lâmpada em direção ao som. Ele viu uma escrava com uma menina , que respousa o rosto no seu colo e dormia. A menina parecia dormir com tranquilidade. A mulher , magra e com uma expressão insegura no rosto, continuava a tocir. Ela parecia querer esconder o rosto da luz que Tértulo lhe dirigia.

Esta tosse iria atrapalhar o seu sono o naquela noite. Ele devia lançar a escrava no mar. Mas, Tértulo olhava para menina dormindo no colo da mãe e exitava fazer isto. Ele se lembrava da sua mãe. Tértulo dizia para si mesmo: “ Não seja dirigido pelos seus sentimentos que são instáveis , relembre seus objetivos que são seus fundamentos. Existe alguma vantagem em deixar esta menina viva com a mãe?” Ele tentava encontrar um motivo, mas não encontrava. A verdade, é que maioria das meninas não veio com a mãe,e criar alguma diferenciação entre as meninas poderia criar problemas entre as escravas. Mas, a também considerava que aquela não era a única que veio com mãe, haviam mais duas. E seria um desperdício mata-las . Tértulo se dirigiu a escrava e disse:

– Pare de tossir. – A sua voz não soava forte, mas ele falava com segurança.

Seria uma fraqueza levantar a voz para falar com seus escravos. Eles precisavam aprender a obedece-lo mesmo quando falasse em voz baixa da. Homens sem poder gritam, porque precisam da altura da voz para reafirmar o que dizem, já que não tem autoridade. Ele tinha autoridade. Se a escrava não parasse de tossir ele a lançaria no mar. Esta seria uma boa oportunidade para ensinar seus escravos a respeita-lo.

Tértulo então, se virou para a direita e para esquerda. Havia várias mulheres ali, mas ele procurava apenas por Andromeda .

– Andromeda

– Sim, meu senhor. – Andrômeda respondia com aquela mesma voz que transparecia submissão ao mesmo tempo que auto-confiança.

– Tire seus vestidos e troque com Effie.

– Sem problemas, meu senhor.

Tértulo virou-se para subir, foi quando a luz da lâmpada trouxe ao seus olhos mais um rosto feminino. Quem era aquela escrava? Ela era bonita. Não tinha os traços finos comos os de Effie. Mas, tinha os lábios grossos os seios fartos. Ele já a havia visto antes. Mas ela estava em prantos. Ela chorava a morte dos seus filhos . E por isto não pode ver a sua beleza em meio aquele escândalo. Agora estava dormindo . Parecia cansada. Qual era mesmo o nome dela? Tértulo não se lembrava.

Tértulo a olhou atentamente, então subiu para a proa. Um soldado mais velho se aproximou dele.

– Agora é hora de trocar o turno dos remadores.

Ele se virou para os homens e gritou:

– Mudança de turnos.

Os homens que descansavam começaram a remar. E, ele se dirigiu ao final da proa, onde se sentou. Ele sabia que teria de dormir ali. Era uma humilhação dormir ali no meio daqueles escravos infereriores. Mas, não havia outro aposento para ele. Naquele momento ele gostaria de ter um navia como o de Menelau. Tértulo tentou se sentar na posição mais autoritária que conseguisse. Mas, não era confortável. Então, mudou de posição . Agora sentia seu corpo relaxando, o sono vindo.

Quando estava perto de dormir ouviu um sussurro. Uma mulher gorda, perguntava ao garoto que havia ficado com o rato de Narek.

– Eu e Sibila vamos ir até a cozinha, sem ninguém ver. E vamos preparar uma sopa para você. Dê-nos o seu ratinho.

Ele abriu de leve um dos olhos e viu o menino estendendo o rato pelo rabo.

– Aqui está.Tértulo não se preocupou com aquilo. O navio não tinha cozinha. Mas, o menino não desconfiou das palavras da senhora, e por isto lhe entregou o ratinho precioso que nunca mais veria.

A noite passou muito rápida para Tértulo. E quando ele despertou sentia o corpo dolorido. Pela manhã caminhava entre os seus escravos esperando espartar o desconforntou do corpo e despertar do sono. Foi quando Narek, revoltado com o rato perdido, se dirigiu a ele.

–Tértulo, Tersistes pegou o meu rato e deu a...

Ele se admirou com audácia do menino, ele era corajoso. Tinha que tomar cuidado com ele. Mas, ainda queria poupar-lhe a vida. Só precisava a ser perspicaz para que não escapasse do seu controle. Ele não deu atenção ao que o menino dizia e ele se aquietou diante do olhar repreensivo dos outros escravos troianos. Ele se dirigiu para a frente do navio e se pôs a olhar o mar. Um pouco depois desceu para ver se estava tudo em ordem com as escravas.Ele descobriu o nome da escrava que observara na noite anterior: era Alexia. E, realmente era bonita. Tértulo escolheu Alexia para seus desejos. Quando tornou a subir recebeu uma informação:

– Tértulo, Menelau está chegando ao navio, ele veio conhecer os escravos.

Cadmus, que olhava para baixo da proa, falava com Tértulo. Ele se aproximou da borda do navio e viu o barco que estava logo abaixo. O rei Menelau subiu no navio.

– Majestade, filho dos deuses, creio que ficará satisfeito ao conhecer seus escravos. A guerra levou a vida de muitos troianos, mas poupou os melhores para o seu serviço.

– Muito bem Tértulo, quero conhece-los. Menelau respondia com uma voz que denunciava algum descrédito em relação ao entusiasmo de Tértulo;

– Temos dois homens capazes que sabem ler e calcular. Ele é Lemnon um grande treinador de cavalos. Tértulo apontava para um dos escravos que remavam.

– E, aquele , sentado ao lado do garotinho magro . Quem é?

– É Aristeu, um dos homens que sabem calcular. Talvez ele faria um bom trabalho na dispensa do palácio.

– Na dispensa. Será que ele é tão bom assim com os números. Sim, pergunte a ele quantos escravos temos? E, virando se para Aristeu perguntou:

– Aristeu, quantos escravos temos no navio?O escravo exitou em responder. Tértulo estranhou, no dia anterior ele havia calculado com tanta exatidão.

– Temos em torno de 40 mulheres e 16 homens. O escravo respondeu com insegurança. Menelau ouviu a resposta com um certo desprezo, ele não parecia tão bom como Tértulo dizia.

– E o tecelão, Tértulo? Você conseguiu algum tecelão? – Sim, consegui um com Ulisses, o rei de Itaca. É aquele logo atrás de Cadmus.

– Ótimo, diga o que mais nós temos.

–Temos mulheres de boa aparência. Pensei que poderíamos separar algumas escravas para o serviço do palácio. Temos até mulheres da nobreza.

– Da nobreza?

– Sim, vou mandar chamá-las. Depois de alguns instantes Tértulo voltou com mais escravas.

– Esta é Ailin, prima do rei Nestor. Está é a linda Effie, sobrinha da rainha Hécuba

– Tértulo apresentou Effie com um sorriso que escondia uma mensagem para Menelau.Mas, como ele não pareceu receptivo a idéia Tértulo continuou e apresentou outra escrava

– E está é a princesa Andrômeda.

– Princesa Andrômeda? Quem é esta princesa?

– Não se lembra dela, meu senhor? É a esposa do príncipe Heitor.

– Andrômeda? De Heitor? Não sabia que ela estava entre os nossos escravos. Achei que pertencia a Neoptelemo. – Não meu senhor, Andrômeda foi capturada por um de nossos soldados. Tértulo falava sobre Andrômeda um pouco de receio. Mas, dificilmente Menelau desconfiaria que aquela princesa foi capaz de fugir de Neoptolemo.

– E as crianças de que me falou. Realmente acha que estas crianças vão nos ser úteis? Para mim crianças só atrapalham. Elas podem ajudar pouco na construção do palácio; Você deveria vender as crianças em Esparta

.– As crianças são escravos mais dóceis. Não tem o rancor da guerra que os demais escravos. Em pouco tempo se tornarão escravos leais e úteis. Eu me responsabilizo por elas. Para que não criem nenhum problema. Já separei uma escrava para tomar conta das crianças.

– Bem, se realmente não criarem problemas pode continuar com elas. Se não, livre-se delas.

Ele continuou apre

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